Craques Eternos: Eusébio, o Pantera Negra

Esse artigo foi originalmente escrito como roteiro para o vídeo acima

Apesar de não ser um país campeão do mundo, a história de Portugal no futebol sempre foi riquíssima de grandes times que marcaram época e de grandes craques que fizeram história. Em uma geração, todos conheciam Rui Costa, Deco e Figo; em outra, se acostumaram a ver a qualidade de Bernardo Silva, Bruno Fernandes e da lenda Cristiano Ronaldo. Ao mesmo tempo, nos últimos trinta ou quarenta anos, se torna cada vez mais comum a ascensão e consolidação de craques africanos na elite do futebol europeu.

Mas há muito tempo já havia um craque africano e também português fazendo história na Europa e construindo um legado eterno. Hoje você vai ver a história de um dos maiores jogadores do século passado: Eusébio, o Pantera Negra.

Início da Lenda

Foto: cena do filme ‘”RUTH”, que conta a história de Eusébio.

Eusébio da Silva Ferreira nasceu em 25 de janeiro de 194 em Maputo, capital de Moçambique, que foi colônia portuguesa até 1975. Seu pai era Laurindo António da Silva Ferreira, um ferroviário, homem branco, nascido em Angola, e que faleceu quando o Pantera tinha apenas oito anos. Sua mãe atendia pelo nome de Elisa Anissabeni, mulher negra, natural de Moçambique. Eusébio não era filho único – longe disso. Era o caçula de uma família com 4 filhos, que vivia numa sociedade em situação de grande pobreza, algo que por si só já é o bastante para causar uma infância repleta de dificuldades, e que aumenta ainda mais quando há tantas bocas para se alimentar e quando o pai da família falece tão cedo.

Apesar disso, o menino Eusébio não se abalava. Sua felicidade era uma só: jogar bola descalço, em campinhos improvisados, com qualquer coisa que fosse minimamente redondae pudesse ser chamada de bola. Em Moçambique, Eusébio aos quinze anos já jogava por uma equipe de futebol, “Os Brasileiros Futebol Clube”, e tinha o objetivo de jogar pelo Desportivo, na época uma filial do Benfica no país africano, mas acabou sendo rejeitado duas vezes devido a um problema no joelho.

Um de seus amigos na época era Hilário da Conceição, que seria futuramente atleta profissional do Sporting CP. Hilário e Eusébio jogaram juntos quando eram crianças no FC Arsenal, no qual Eusébio tinha dificuldades devido a sua estatura, afinal era mais novo do que os demais. No entanto, era inegável a habilidade do garoto, tanto que aos 16 anos já era apelidado de Pelé por seus amigos, em referência ao gênio do futebol mundial daquela época.

E se a filial do Benfica não aceitou Eusébio, a do Sporting recebeu indicação do próprio Hilário e não cometeu o mesmo erro. O clube leonino foi o primeiro da carreira de Eusébio, onde ele disputou mais de 40 partidas e marcou quase 80 gols, números muito acima do normal. Naturalmente, acabou chamando a atenção dos clubes de Portugal, e além disso fez saltar os olhos de José Carlos Bauer, ex-jogador do São Paulo, que viu Eusébio jogar e o indicou para o tricolor paulista, que no entanto o rejeitou. Naquele mesmo ano de 1960, Bauer também o indicou para um homem que já havia sido seu técnico em outro momento, e que agora comandava o Benfica. Esse homem era o húngaro Béla Guttmann.

Leão virou Águia 

Foto: Keystone/Getty

Guttmann viu com bons olhos a vinda do então jovem de 17 anos Eusébio para os Encarnados, mas com uma ascensão tão meteórica na filial do Sporting, era inevitável que os Leões também fossem lutar pelo rapaz. A história que contam é de que o Leão de Lisboa já tinha tudo acordado com o Lourenço Marques para que Eusébio trocasse a filial pela matriz, no entanto os dirigentes do Benfica usaram da mais genuína malandragem, colocaram Eusébio em um avião deles e o fizeram voar em direção dos Encarnados, de Moçambique para Portugal. No local, encaminharam o jovem para um hotel e ainda fizeram a mãe de Eusébio assinar um contrato em nome do jogador, oferecendo uma boa quantia de dinheiro como estímulo.

Ele viajou como um Leão e acabou se tornando uma Águia, praticamente sem querer. O negócio já estava feito e não havia nada que o Sporting pudesse fazer, pois Eusébio não queria quebrar a palavra de sua mãe. O outrora apelidado de “Pelé” quando menino eventualmente passou a ser o Pantera Negra, apelido que fazia referência a sua força e velocidade, que agora serviriam ao Benfica, onde apenas viria a estrear no ano seguinte, em 1961. Na ocasião, entrou em campo num péssimo dia, quando o Benfica foi derrotado por 4×1 contra o Vitória de Setúbal. Mas o bom presságio estava ali, e Eusébio marcou seu primeiro gol com a camisa vermelha.

Vale ressaltar que, naquela época, o Benfica era simplesmente o atual campeão da Copa dos Campeões, tendo acabado com o reinado do Real Madrid que havia vencido as 5 primeiras edições da principal competição de clubes da Europa. Eusébio era um jovem craque e chegava, em tese, para compor um grupo que já era extremamente forte, com jogadores históricos como Costa Pereira, Mário Coluna, José Águas e Domiciano Cavém.

Nesse grupo, Eusébio estava pronto pra mostrar seu futebol para a Europa: um jogador extremamente rápido, com muita força física, qualidade técnica e letalidade notória na hora de finalizar. Guardadas as devidas proporções, o Pantera era um jogador com características muito parecidas com as de Pelé – não à toa era comumente comparado ao Rei do Futebol, e iniciaria assim sua brilhante jornada no futebol.

Início Glorioso

Foto: Evening Standart/Getty

A primeira temporada de Eusébio no Benfica não foi tão boa no campeonato português. Como é até os dias atuais, a briga era entre os Encarnados, Porto e Sporting, e naquela edição da liga os Leões ficaram com a taça, fazendo 7 pontos a mais do que o Benfica, que ficou atrás também do Porto na tabela. Algo que de certa forma poderia servir como uma boa resposta a perda de Eusébio para os rivais, afinal mesmo sem ele conseguiram vencer o principal título do país.

No entanto, o time de Béla Guttmann tinha uma frente ainda mais importante para lutar e essa era a Copa dos Campeões, onde o Benfica era o atual campeão e queria estender esse reinado por mais um ano.

A chegada de Eusébio só tornou aquele time mais forte, e o Pantera Negra aos poucos foi se tornando dono do time. A primeira eliminatória do Benfica naquela edição foi nas oitavas de final contra o Áustria Viena — já que a Champions não tinha fase de grupos naquela época, e direto na segunda fase pois o time pulou a primeira por ser o atual campeão.

Após um empate em 1×1 na Áustria, os Encarnados passaram por cima na volta, vencendo por 5×2 num jogo em que Eusébio marcou o seu primeiro gol europeu. Na fase seguinte o adversário era mais complicado: o Nuremberg da Alemanha surpreendeu ao vencer a primeira partida das quartas de final contra o Benfica por 3×1. Mas a decisão seria no Estádio da Luz, e aí o buraco foi mais embaixo pros alemães. Eusébio marcou 2 dos 6 gols benfiquistas naquele dia, em uma vitória esmagadora por 6×0, que carimbou a passagem do Benfica pra semifinal da Champions.

O rival no caminho para a final seria o inglês Tottenham, que conseguiu não tomar gol de Eusébio na eliminatória, mas perdeu o jogo de ida por 3×1 em Portugal, e mesmo com os Spurs vencendo em Londres por 2×1, não foi o bastante para avançar à grande decisão. Em seu primeiro ano na Europa, Eusébio já iria disputar a sua primeira final da Copa dos Campeões, o principal torneio de clubes do continente. 

Foto: Reprodução

O rival da grande decisão? Simplesmente o Real Madrid, que tava louco pra recuperar a coroa da Europa após ter perdido a chance de ser hexa na edição passada pro Benfica. A final ocorreu na Holanda, no Estádio Olímpico de Amsterdã, em 2 de maio de 1962, para um público de mais de 60 mil pessoas. O que se viu em campo foi nada menos do que um verdadeiro espetáculo: no primeiro tempo, num frenesi de gols de ambos os lados, o Real Madrid saiu vencendo por 3×2 com hat-trick do imparável Ferenc Puskas. José Águas e Domiciano Cavém haviam marcado para o Benfica, e logo no começo da segunda etapa, Mário Coluna conseguiu empatar a partida para os portugueses.

O jogo estava 3-3 e era um confronto digno dos dois times mais fortes da Europa, onde quem tivesse uma carta na manga sairia com a taça. E pra sorte dos encarnados, eles tinham uma que atendia pelo nome de Eusébio da Silva Ferreira. Aos 20 do segundo tempo, o Pantera Negra marcou de pênalti para virar a partida e apenas 3 minutos depois, numa cobrança de falta ensaiada, acertou um chutaço no canto direito do goleiro, ampliando o placar para 5×3 e selando o bicampeonato europeu do Benfica. O jovem de 20 anos, que até pouco tempo era apenas um jogador de uma filial do Sporting em Moçambique, agora era um dos protagonistas da conquista da principal taça do futebol europeu. 

Com a conquista do bicampeonato europeu, o técnico húngaro Béla Guttmann requisitou um aumento em seu salário para seguir comandando o time dos Encarnados. Apesar de todo o sucesso e competência do treinador, a então diretoria do Benfica negou prontamente, e assim ele se revoltou e decidiu deixar o clube português. Antes disso, ele proferiu uma frase: “Sem mim, nem em cem anos o Benfica conquistará uma taça continental.”. Talvez meras palavras de revolta, vazias e que logo seriam esquecidas e sumiriam como poeira ao vento. Ou talvez não. Em todo caso, o técnico chileno Fernando Riera foi o homem escolhido pra dar continuidade ao forte Benfica, que iria em busca de vencer tudo na temporada seguinte. 

Eusébio e Pelé 

Foto: Mirrorpix/Getty

Em 1961, quando conquistou sua primeira Copa dos Campeões, o Benfica não conseguiu se tornar campeão mundial ao perder a final da Copa Intercontinental para o Peñarol. Agora em 1962, eles tinham um argumento a mais para tentar outra vez: Eusébio. Só tinha um pequeno problema.

Naquele ano, o campeão da Libertadores da América foi o Santos. O Santos de Pelé. O Rei do Futebol, o melhor jogador do mundo, com o qual o jovem Eusébio tantas vezes foi comparado, agora seria o rival dele na disputa pelo título mundial. Algo que, sem dúvida, era fantástico, poder enfrentar uma verdadeira lenda viva. Mas ao mesmo tempo era terrível.

Em 1961, o Benfica já havia enfrentado o Santos em um jogo amistoso em Paris, no qual Eusébio marcou 3 gols e Pelé 2. Mas no fim o Santos venceu por 6×3, mostrando sua superioridade. Em 1962, Pelé e Eusébio se enfrentaram mais duas vezes em partidas amistosas, dessa vez pelas seleções de Portugal e Brasil, e mais uma vez o Rei saiu vitorioso nas duas. Será que agora, valendo taça, seria diferente? 

Foto: Popperfoto/Getty

Em 19 de setembro de 1962, o Benfica viajou até o Brasil para enfrentar o Santos no Maracanã com mais de 85 mil espectadores ansiosos pelo jogo de ida da Copa Intercontinental. Sem cerimônia, Pelé se apresentou de forma clara para os europeus, marcando 2 gols na vitória por 3×2 do Peixe.

Mas a margem era pequena e o jogo da volta seria no Estádio da Luz, em Portugal, com mais de 70 mil portugueses empurrando o Benfica. Mas como eu disse, se por um lado era bom enfrentar o Rei do Futebol, por outro era terrível. Em pelo Estádio da Luz, Pelé comandou um verdadeiro espetáculo, marcando 3 gols e dando uma assistência na vitória aterradora do Santos por 5-2. Eusébio marcou um dos dois gols que diminuíram o massacre daquele dia. Mais uma vez, o Benfica era vice no Mundial, perdendo para um adversário mais do que digno. 

No entanto, a história dos confrontos entre Eusébio e Pelé não acabava ali. O destino ainda queria que eles se encontrassem mais uma vez, no palco máximo. 

Domínio Nacional e Frustrações Europeias  

Foto: Kent Gavin/Getty

Se no primeiro ano Eusébio não conseguiu conquistar o campeonato português, na temporada seguinte a coisa seria muito diferente. Em sua segunda edição disputando o campeonato, Eusébio já conseguiu a sua primeira taça da liga portuguesa, com o Benfica batendo o Porto pelo título com 6 pontos de vantagem. O artilheiro do campeonato foi o encarnado José Torres, marcando 26 gols, enquanto o menino Eusébio marcou 23 tentos, chegando muito perto da sua primeira artilharia, o que seria apenas o início da sua veia goleadora na liga portuguesa.

O grande objetivo da temporada 1962-63 era naturalmente tentar repetir o feito do Real Madrid e iniciar uma dinastia europeia. Eliminando primeiro o Norrkoping da Suécia, depois o Dukla Dejvice da República Tcheca e o Feyenoord da Holanda, o Benfica estava mais uma vez na final da Copa dos Campeões, onde iria enfrentar o Milan da Itália. No caminho até a final, Eusébio marcou 5 gols em 6 partidas, sendo o artilheiro do Benfica na competição.

A grande final contra o Milan foi em 22 de maio de 1963, para um público de 45 mil pessoas no estádio Wembley, na Inglaterra. Não demorou muito pra Eusébio mostrar porque era considerado um dos melhores jogadores da Europa ainda tão jovem, logo aos 19 minutos abrindo o placar contra o Milan, arrancando pela direita até invadir a área e soltar um chutaço cruzado, sem chance pro goleiro, um gol na mais pura característica do craque lusitano.

Mas o que começou como a final dos sonhos acabou se tornando um pesadelo. Após ir muito bem no primeiro tempo e ir pro intervalo com a vantagem, na segunda etapa o Benfica deu branco e tomou dois gols do artiilheiro daquela Champions, José Altafini – o Mazzola – num espaço de apenas 11 minutos. Ali acabou o sonho do tri europeu para o Benfica e, pela primeira vez, as palavras ditas por Béla Guttmann começaram a assustar. Ali começava o que é conhecido até os dias de hoje como A Maldição de Béla Guttmann. 

Foto: Reprodução

Em 1963-64, apesar de cair nas oitava da Copa dos Campeões o Benfica tinha uma certeza que iluminava os seus dias: eles estavam criando um monstro. O bicampeonato português veio com estrondosa temporada de Eusébio, que pela primeira vez foi artilheiro da liga nacional, marcando 28 gols, 6 a mais do que o vice-artilheiro.

Aquilo nada mais era do que um pequeno prelúdio do que estava por vir, pois Eusébio viria a emplacar uma série de artilharias na liga portuguesa, não dando chance pra mais ninguém ser o principal goleador do país. Em 1964-65, voltou a repetir o número de 28 gols, no ano do tricampeonato nacional do Benfica. Aquela temporada, assim como a de 1962-63, teve tudo para ser o grande ano mágico dos Encarnados, pois mais uma vez eles tiveram a chance de conquistar o tricampeonato da Copa dos Campeões. 

A campanha individual de Eusébio na Copa dos Campeões de 1964-65 foi assombrosa: 3 gols na primeira eliminatória, 1 gol na segunda eliminatória, 3 gols nas quartas de final (contra o Real Madrid) e 2 gols nas semifinais. Vale o lembrete de que naquela época, a Copa dos Campeões – hoje a Champions – não tinha fase de grupos, eram duas fases eliminatórias iniciais que classificavam os times pras quartas de final.

Eusébio marcou em todas essas fases e foi o artilheiro da competição, empatado em número de gols com seu companheiro José Torres. O rival do Benfica na decisão seria mais uma vez italiano, agora o outro time de Milão: a Internazionale. Eusébio estava no seu auge, melhor impossível. Era o artilheiro do campeonato português e o artilheiro da Champions, não havia melhor jogador na Europa àquela altura.

Só que mais uma vez, o Benfica saiu derrotado. Aos 42 minutos do primeiro tempo, um gol do brasileiro Jair imprimiu mais um vice-campeonato europeu aos Encarnados. E o pior: o gol veio num frangaço do goleiro lendário Costa Pereira.

Foto: SL Benfica/Getty

Mais uma vez, Eusébio não tinha nada a trazer de uma final europeia além de frustração. E mais uma vez, a maldição de Béla Guttmann assustava. Apesar de tudo, era inegável o desempenho individual fantástico de Eusébio, e como reconhecimento, naquele ano de 1965, ele venceu a Bola de Ouro da France Football, sendo reconhecido como o melhor jogador da Europa. Eusébio foi o primeiro e até o dia de hoje o ÚNICO jogador que venceu a Bola de Ouro atuando em Portugal. Vale o destaque também de que Eusébio era português e moçambicano, então apesar de costumarmos dizer que o Weah foi até hoje o único africano Bola de Ouro, também podemos considerar o Eusébio como o primeiro africano a vencer o prêmio, além de indiscutivelmente ter sido o primeiro homem negro a receber a principal honraria do futebol europeu. 

Na temporada de 1965-66 o sucesso coletivo do Benfica não veio, com o time perdendo o campeonato nacional para o Sporting, assim deixando escapar a chance de um tetra seguido. Só que Eusébio não fraquejou e assegurou a sua terceira artilharia seguida do campeonato português, guardando 25 gols.

Aquela temporada era mais do que especial, pois culminava no principal evento do futebol. Era ano de Copa do Mundo, a Copa de 66 na Inglaterra, e Portugal teria um trunfo mais do que valioso: o Pantera Negra, melhor jogador da Europa, jogava para defender as cores lusitanas e chegaria com tudo para o Mundial. 

Mundial de 66

Foto: Popperfoto/Getty

Desde o começo, era sabido que a Copa do Mundo de 1966 não seria nada fácil para Portugal, com o grupo logo de cara já mostrando isso: enfrentariam Bulgária, a até então fortíssima seleção da Hungria e os atuais bicampeões do mundo, o Brasil de Pelé e cia. Mais uma vez, Eusébio iria se encontrar com o lendário Pelé, o qual ele já havia enfrentado em alguns amistosos e na final do mundial de clubes, e até então havia perdido sempre. Era a hora da revanche, no palco máximo, onde todos os grandes jogadores querem estar. 

A primeira partida de Portugal foi logo contra a Hungria, uma oportunidade de ouro para a seleção das quinas mostrar a que veio, e eles não desperdiçaram, vencendo os húngaros por 3×1, com dois gols de José Augusto e 1 de José Torres, este com assistência de Eusébio

A segunda partida foi uma vitória completa por 3×0 contra a Bulgária, onde Eusébio marcou o seu primeiro gol na competição. A partir dali, o homem não pararia mais.

Foto: Popperfoto/Getty

A terceira e última partida da fase de grupos marcaria o reencontro entre Eusébio e Pelé, numa partida de caráter absolutamente decisivo. O Brasil havia vencido a Bulgária e sido derrotado pela Hungria, portanto chegava pra última partida precisando vencer de qualquer jeito ou seria eliminado – lembrando que naquela época a vitória dava apenas 2 pontos.

Esse jogo ficou marcado como um dos maiores da história de Portugal. Para parar Pelé, os portugueses usaram a estratégia de parar o Pelé do jeito que dava – muitas vezes na porrada – e de depender do Pantera Negra lá na frente.

Assim, veio uma vitória por 3×1 contra os atuais bicampeões do mundo, onde Eusébio destruiu, marcou duas vezes, e mandou Pelé e a seleção brasileira de volta pra casa ainda na fase de grupos.

O homem que quando garoto foi apelidado de Pelé, um nome que naquela época parecia tão distante, algo quase que fictício, derrotaria o ídolo no palco máximo do futebol. Naquele dia, Eusébio se apresentou para o Brasil inteiro e para o mundo. Foi também nesse dia que o Pantera Negra e Pelé começaram uma boa amizade, segundo palavras do próprio Rei. Pelé chamava Eusébio de irmão e, em uma entrevista em 2016 quando perguntado sobre Messi x Cristiano, cravou:

“Não podemos esquecer outro, não podemos esquecer Eusébio. Coloco-o à frente desses dois.”

Portugal então avançou e enfrentou a Coreia do Norte nas quartas de final, partida na qual Eusébio estava impossível e marcou 4 gols na vitória por 5×3 dos lusitanos. Portugal estava nas semifinais da Copa do Mundo e teria pela frente os anfitriões: a seleção da Inglaterra. O Pantera Negra até marcou, mas não foi o suficiente para impedir a derrota de Portugal, que caiu por 2×1 frente aos ingleses.

Na disputa de terceiro lugar, Eusébio foi às redes de pênalti contra o lendário goleiro Lev Yashin, e ajudou Portugal a derrotar a União Soviética, concretizando assim aquela que é, até hoje, a melhor campanha da história da seleção portuguesa nas Copas do Mundo. Eusébio foi com sobras o artilheiro daquela Copa do Mundo, com 9 gols marcados. 

Melhor da História do Futebol Português

Foto: Popperfoto/Getty

A temporada 1966-67 mostrou que Eusébio não estava nem um pouco abalado pelas recentes derrotas na final da Champions e na semifinal da Copa do Mundo. O craque atingiu seu melhor registro de gols no campeonato português, cravando 31 bolas na rede e levando o Benfica a mais uma conquista da liga nacional.

O Pantera Negra estava faminto e em 1967-68, a coisa foi ainda mais brutal: Eusébio marcou 42 vezes nas 26 rodadas do campeonato português, uma média absurda superior a 1,6 gols por jogo e, mais uma vez, guiou os encarnados para a conquista da liga portuguesa, junto a sua 5ª artilharia seguida no campeonato. Uma artilharia colossal, uma média de gols absurda e que cada vez mais colocava Eusébio num lugar que ele ocupa até os dias de hoje: o de melhor jogador da história do futebol português. Em Portugal, ninguém jamais jogou mais do que Eusébio

Mas apesar de tudo, o gênio de Moçambique ficou com uma eterna marca em sua carreira: a frustração de não conseguir repetir a conquista da Europa, feita em sua primeira temporada com o Benfica. Em 1967-68, mais uma vez, Eusébio foi a guerra com todas as suas forças na Europa, levando novamente o Benfica à decisão da Copa dos Campeões e sendo mais uma vez artilheiro da competição. Não poderia ser possível que o Benfica perdesse a terceira final de Copa dos Campeões seguida, justamente após Béla Guttmann proferir tais palavras, que até hoje assustam os arredores do Estádio da Luz. Mas sim, foi possível.

Os encarnados empataram contra os ingleses do Manchester United no tempo normal, mas sucumbiram na prorrogação e foram derrotados por 4×1 pelo lendário United de Matt Busby.

Eusébio havia disputado a sua quarta e última final da Copa dos Campeões, tendo vencido a primeira e perdido as outras 3. É inegável que Eusébio alçou o Benfica a um patamar que o clube jamais voltou a alcançar até os dias de hoje, mas sempre vai ficar a sensação de frustração de que poderia ter sido mais, poderia ter sido melhor. Hoje, o Benfica já poderia ser tri, tetra ou até pentacampeão europeu, graças ao presente que foi ter um gênio que raramente aparece no futebol. Mas ainda assim, Eusébio marcou uma era nos encarnados, que jamais será esquecida e que o faz até hoje ser o maior ídolo da história do clube. 

As despedidas

Foto: Ron Pornall/Getty

Nos anos seguintes, Eusébio ainda faturou mais duas artilharias do campeonato português, com 20 gols em 1969-70 e 40 gols em 1972-73, já aos 31 anos de idade. Além disso, guiou o Benfica para ainda mais 5 conquistas no país, totalizando em sua carreira 11 campeonatos portugueses vencidos, até hoje o maior vencedor dessa competição. Além da Copa dos Campeões, Eusébio também venceu 5 Taças de Portugal, assim totalizando a conquista de 17 títulos de maior grandeza pelo Benfica.

Além disso, foram 7 artilharias do campeonato português e mais 3 artilharias da Copa dos Campeões. Dentre essas artilharias locais, duas delas garantiram a Eusébio a Chuteira de Ouro da Europa, prêmio dado ao jogador com mais gols em todas as ligas do continente na temporada. Foram as de 1967-68, com 42 gols, e de 1972-73, com 40 gols. 

Em 1975, Eusébio colocou um fim a sua história no Benfica. Nos anos seguintes, teve breves passagens por diversos clubes em diversos páises como os Estados Unidos, México, Canadá e também em Portugal, onde vestiu a camisa do Beira-Mar e do Tomar. Vale o destaque de que durante suas passagens nos Estados Unidos, chegou a enfrentar novamente Pelé, que também atuava lá naquela altura, pelo New York Cosmos, enquanto Eusébio jogava pelo Las Vegas Quicksilver.

O último clube do Pantera Negra foi o New Jersey Americans, onde ele se aposentou em 1979, sofrendo com diversas lesões àquela altura. Notável como o Pantera ficou 15 anos no Benfica, mas depois disso jogou em 7 clubes diferentes em 3 anos. Parecia que estava destinado a vestir a cor dos encarnados mesmo.

Eusébio, o Pantera Negra

Foto: Anadolu Agency/Getty

Eusébio marcou 733 gols em 745 partidas, entre jogos considerados oficiais e não-oficiais. Pelo Benfica foram 473 gols em 440 jogos, sendo com sobras o maior artilheiro da história do clube. Por Portugal, foi às redes 41 vezes em 65 partidas.

Dentre suas muitas conquistas individuais, estão as de 9º melhor jogador do século XX pela IFFHS, 8º melhor jogador do século XX pela Placar e 10º melhor jogador do século XX pela World Soccer.

Em 5 de janeiro de 2014, o mundo do futebol esteve de luto. Morreu Eusébio, o Pantera Negra, aos 71 anos, vítima de uma parada cardiorrespiratória. Seu corpo foi velado no Estádio da Luz, palco de suas maiores glórias, sua casa de sempre, que até hoje tem uma magnífica estátua do maior jogador da história daquele lugar, ninguém além de Eusébio.

Até os dias de hoje, Eusébio é recordado como o jogador que mudou a história da seleção de Portugal e do futebol português como um todo, sendo responsável por fazer o país inspirar respeito nas Copas do Mundo e por marcar uma época de um Benfica temido no cenário europeu, que derrubou outros gigantes em diversas ocasiões. Eusébio, craque, gênio, atleta negro, moçambicano, português, africano e também europeu, independente de qual termo você prefira usar para se referir a ele, merece muito mais um que melhor simboliza o que ele é para a história do futebol: eterno.

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Yuri Dantas
Yuri Dantas
Membro do Euro Fut há mais de 7 anos. Escrevi mais de 100 roteiros pro canal, hoje trabalho nas redes sociais e comento no Euro Cast. Tenho também meu próprio canal no YouTube - Yuri Dantas.

Vale a pena conferir

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